Belo Horizonte começou a viver, em outubro de 1976, as emoções do motociclismo “todo terreno”, também conhecido como “trail” — uma modalidade que crescia em popularidade e se firmava como uma nova vertente do esporte off-road no Brasil.
No domingo, 16 de outubro, o Trail Clube Minas Gerais realizou sua quarta prova oficial, reunindo mais de 50 pilotos em uma competição de aproximadamente 100 quilômetros. O percurso ligou a capital mineira ao distrito de São Sebastião das Águas Claras, mais conhecido como Macacos, localizado no município de Nova Lima — região famosa por sua geografia acidentada, estradas desativadas e leitos de rios, ideais para esse tipo de desafio.
A largada ocorreu às 9 horas, na Praça da Liberdade, com os competidores partindo a cada 30 segundos. A rota incluiu trechos da zona sul de Belo Horizonte, passando por trilhas que cortavam a serra, atravessavam Macacos e seguiam até Nova Lima. A chegada se deu na Avenida Afonso Pena, em frente ao restaurante Brunela, com os primeiros participantes cruzando a linha de chegada por volta das 15h30.
Batizada de “Enduro — Perdido de Macacos”, a prova fez referência a um antigo caminho abandonado que ligava Belo Horizonte ao distrito de Macacos — rota histórica que havia sido redescoberta e adaptada para a prática do motociclismo fora de estrada.
As etapas do percurso também chamaram atenção pelos nomes pitorescos, muitos deles já conhecidos entre os adeptos locais do trail: “Cavalo Morto”, “Noiva Voadora”, “Variante da Vaca Oca” e “Passagem do Copo d’Água” foram apenas alguns dos desafios enfrentados pelos pilotos durante a prova.
Segundo o presidente do Trail Clube, engenheiro Paulo Henrique Vaz de Melo, a proposta do grupo era adaptar o esporte às condições brasileiras, levando em conta não só os aspectos técnicos, mas também realidades sociais, econômicas, culturais e geográficas. A cada edição, o clube buscava testar novos modelos de prova, com ajustes no formato e nos regulamentos.
Nas primeiras disputas, por exemplo, os pilotos só conheciam o trajeto no momento da largada. Já nesta edição, os participantes receberam a planilha com o roteiro com antecedência, podendo treinar o percurso. As médias de velocidade e os tempos ideais, no entanto, só foram divulgados no dia da competição.
O sistema de pontuação também evoluiu. Postos de Controle (PCs) foram espalhados ao longo do trajeto, onde os próprios concorrentes registraram, em cartões individuais, os horários de passagem. Foi adotada uma tolerância de apenas 1 minuto em relação ao tempo ideal. Fora disso, cada segundo de atraso ou adiantamento resultava na perda de um ponto. O modelo foi inspirado na Welsh Trail Ride Association, do Reino Unido.
Na época, o motociclismo fora de estrada ainda não contava com regulamentações internacionais ou campeonatos mundiais. As regras variavam de país para país, e o esporte se organizava de forma independente. O motociclismo, de modo geral, era dividido entre as categorias “street” (em vias pavimentadas) e “off-road” (fora de estrada). Dentro desta última, destacavam-se modalidades como o motocross, o enduro, o trial, a corrida de deserto, a subida de montanha e o speedway.
As inscrições para a prova foram feitas na sede da Federação Mineira de Motociclismo, na Avenida Nossa Senhora do Carmo, nº 72, com atendimento prestado por Francisco Laender.
Diário da Tarde – 24 de outubro de 1977 – Dirceu Pereira e Zezito
Veja como apoiar o Ecomuseu do Off Road para continuarmos a oferecer o melhor da história, conteúdos e eventos do universo off road do Brasil.